O agressivo discurso já causou danos reais – artigo Eduardo Silveira
A eleição de Donald Trump continua cercada de muita apreensão por vários setores da comunidade internacional e da sociedade norte-americana, principalmente por sua campanha ter se baseado, em boa parte, na retórica do “Nacionalismo Racial”, que pode ser melhor compreendido pelas palavras do The Crusader, a publicação do mais antigo grupo racista que defende a supremacia branca nos Estados Unidos, que afirmou que a América apenas se tornou grande porque foi fundada por pessoas brancas e cristãs.
O jornal da Ku Klux Klan declarou o seu apoio oficial a Donald Trump. Nascida durante a Guerra Civil Norte-Americana, quando a escravidão foi abolida, a Ku Klux Klan marcou a história americana com o linchamento de negros no sul, incorporando também, ao longo do tempo, o preconceito contra judeus, homossexuais e imigrantes. A campanha de Trump atraiu o apoio dos grupos que defendem a supremacia branca ao revelar os planos do candidato sobre à entrada de muçulmanos e mexicanos no país, bem como a pretensão de expulsar 11 milhões de imigrantes ilegais, que, na prática, é inviável do ponto de vista logístico e financeiro, mas seduziu os adeptos da corrente política que culpa estrangeiros e minorias pelas dificuldades econômicas da Nação. Num primeiro momento, Trump deixou-se cortejar por estes grupos, porém, na reta final, rejeitou o seu apoio em um Comunicado: “O senhor Trump e a campanha condenam qualquer forma de ódio. Essa publicação é repulsiva, e as suas visões não representam as dezenas de milhões de norte-americanos unidos em torno da nossa campanha”. Por isso, pode-se dizer que, em relação à questão racial, Trump representa uma incógnita sobre a postura que adotará em seu governo.
O histórico não ajuda. Sua imobiliária foi processada pelo Governo Nixon na Década de 70 por práticas racistas, tendo o caso terminado em um acordo judicial. Anos mais tarde, novas acusações sobre práticas racistas em seus cassinos, denunciadas por pessoas ligadas à ele.
O “candidato” Trump foi grosseiro e extravagante, proferindo ataques verbais contra mulheres, muçulmanos, negros e imigrantes.O “Presidente Eleito” Trump deixará para trás o personagem eleitoral e irá adotar uma atitude de prudência, pragmatismo e sensatez? Nos primeiros dias após a eleição de Trump, uma séria de casos de racismo foi denunciada em todo o país, que vão desde o professor que ameaçou a parte negra da sua sala de aula até a prefeita que riu publicamente de uma piada que comparava Michele Obama a uma “macaca de saltos”. Ou seja, o agressivo discurso de campanha de Trump, mais do que danos simbólicos, já causou danos reais, pois implicou em legitimar e conceder uma espécie de autorização velada para esse tipo de comportamento intolerante, que pode inflamar uma sociedade que vinha lidando com o problema racial de maneira menos agressiva. Uma coisa é certa: pior que as fronteiras físicas que muitos pretendem impor à estrangeiros e imigrantes, é a fronteira mental criada pela repulsa arrogante às diferenças.
* Eduardo Silveira Martins
Coordenador da Comissão Antidiscriminação da 12a. Subseção OAB SP